Transcrição: entrevista com Keka Reis sobre literatura infantojuvenil, no podcast Pois É, Poesia
Acompanhe a participação da escritora, roteirista e dramaturga Keka Reis no episódio "Literatura Infantil/Juvenil: o fabuloso mundo da leitura", que pode ser visto na íntegra neste link.
(Vinheta: Pois é, Poesia)
Reynaldo Bessa:
Vamos falar agora de um livro que está fazendo o maior
sucesso não só no universo da literatura, mas também no teatro, no cinema,
série e muito mais. A escritora Keka Reis, autora do livro “O Dia em que a
minha vida mudou por causa de um chocolate comprado nas Ilhas Maldivas” (ufa) fala
sobre este livro, entre outras coisas.
Keka Reis é escritora, roteirista e dramaturga. Começou a
sua carreira na MTV nos anos 1990, onde produziu e dirigiu programas de TV e de
diversos tipos de formatos, trabalhou em vários longa-metragens voltados para o
público infantojuvenil e já publicou 4 romances para essa faixa etária. “O Dia
em que a minha vida mudou por causa de um chocolate comprado nas Ilhas
Maldivas” e “O Dia em que a minha vida mudou por causa de um pneu furado em
Santa Rita do Passa-Quatro”, ambos finalistas do prêmio Jabuti em 2018 e 2019, “Medley
ou os dias em que aprendi a voar” , finalista do prêmio AEILIJ de literatura em
2022 - Associação de Escritores e Ilustradores de Literatura Infantil e
Juvenil. E “Sozinha”, outro livro, vencedor do Prêmio AELIJ de literatura em
2023 (melhor texto juvenil) e finalista do Prêmio Jabuti no mesmo ano.
Keka Reis também já trabalhou como chefe de salas de roteiro
para streamings como Disney e Amazon Prime e esteve na equipe de roteiristas de
inúmeras animações nacionais. Em 2024, a série “O dia em que a minha vida
mudou”, criada por ela e escrita em parceria com Thomas Huszar, estreou no
canal Gloob.
Keka Reis, enfim, você esperou muito aí. Coisa assim acaba
se estendendo. Tudo bem, seja muito bem-vinda, Keka, querida.
Keka Reis:
Obrigada, Bessa, é um prazer estar aqui, uma honra. Imagina,
esperei não, fiquei ouvindo esse pessoal todo maravilhoso. Pedro Bandeira, Tino
(Freitas), Cristino (Wapichana) foi maravilhoso.
Reynaldo Bessa:
Gostei demais do seus óculos, viu?
Keka Reis:
Ah, que bom. Dá uma felicidade, não é? Dá uma animada na
cara.
Reynaldo Bessa:
Keka, uma provocação logo de cara, porque o programa aqui
tem esse viés, né, claro, de forma gentil, educada, bacana, inteligente, mas
também provocar pra saber o que o autor também pensa, além de seus livros, enfim,
né? A gente não sai muito desse roteiro, mas de vez em quando a gente dá uma
saidinha, não é?
“O dia em que a minha vida mudou por causa de um chocolate
comprado nas Ilhas Maldivas”... bom, como escritor, sei que há uma certa
resistência por parte das editoras a títulos longos para a publicação de
livros, e elas acham que esses títulos não são comercialmente viáveis nada,
nada, né? Eu já tive várias conversas sobre isso com alguns editores, porque eu
gosto de títulos longos. Apesar de que seu livro contraria esse pensamento das
editoras, né? Gostaria de saber se você encontrou alguma resistência ao título
logo de início e se sim, como conseguiu mantê-lo até o final ou se foi de boa,
né? Você disse assim, você bateu o pé e disse, no meu título ninguém mexe ou
foi de boa desde o início? Como é que foi isso?
Keka Reis:
Bessa, por incrível que pareça, não encontrei resistência
nenhuma. Eu também achei que eu fosse ter, eu coloquei, eu sempre gostei, eu
tenho uma dificuldade em dar nomes às coisas assim, escrevendo não só
literatura, mas roteiro, né, que é o que eu mais escrevo. Tenho dificuldade de
dar nome para personagem, acho nome uma coisa muito importante. E esse eu achei
porque ele estava muito ligado com a história desde o princípio assim, né?
Então acho que ele veio tão costurado com a história do livro e aí, claro,
houve uma coisa, será que vai caber na capa? Existe uma preocupação assim.
Depois, quando a gente transforma em série, por exemplo, os nomes dos episódios
também são longos e aí não cabe nem ali, naquela parte do streaming que se
escreve o nome, entendeu? Então tem isso, mas, por incrível que pareça, não teve
resistência nenhuma assim.
Reynaldo Bessa:
Que maravilha! Que bacana, viu? Eu imaginei que tivesse,
porque há casos e há casos, né? Que bom que você... há títulos que caem, eu também tenho uma
alguma dificuldade. Às vezes eu pego trechos, estou lendo poesia, pego um verso
ali do Dylan Thomas, enfim, Faulkner, né? E aí pego uma frase e visto, pela
dificuldade, às vezes, de conseguir um títuloo, porque título é difícil mesmo,
né? Mas que bom.
Keka Reis:
Muito.
Reynaldo Bessa:
Mas que bom que você já, enfim, não encontrou essa
dificuldade. E é um e é um belo título. “O dia em que o dia em que a minha vida
mudou”, esse livro tornou-se um best-seller pré-adolescente que já virou peça
de teatro e uma série que estreou dia 6 de maio de 2024 no Gloob, não é isso?
Entre outras coisas, ao que você atribui - eu sei que é muito difícil -, mas
quando você pensa nesse livro fazendo sucesso como ele está fazendo? Ao que
você atribui o sucesso dele.
Keka Reis:
Eu acho que duas coisas. A primeira tem a ver com essa faixa
etária nessa transição da infância para adolescência, é uma faixa etária muito...
Tem muitos livros que são livros consumidos por eles. Eles entram nessa idade
um pouco na fantasia Harry Potter, por exemplo, começa assim aos 10,11. Mas eu
acho que existem poucos livros que tocam diretamente nessa transição. Livros
que falem do desafio de você ser uma criança de uma hora para outra já não é
mais tão criança, mas também não quer ser adolescente. Esse ir e vir que é tão
típico dessa fase. E eu acho que “O Dia” fala diretamente com esse pessoal que
está indo e vindo, indo e vindo, que é típico dessa idade, né? E uma outra
coisa eu acho que -desconfio, tá? -, também tem a ver com o fato de eu ser
roteirista e de ser uma narrativa muito quebrada, cheia de flashback, vai e
volta, porque eu sou muito dessa, né? E também fluida, acelerada, assim. Eu sou
assim, eu falo rápido, eu escrevo rápido, eu faço tudo rápido. Mas a minha
vivência, o meu trabalho com o roteiro durante muitos anos, especialmente para
essa faixa, eu acho que fez com que o livro ficasse numa linguagem muito
próxima a esse público, e que eles gostassem de consumir porque tem a ver com a
velocidade deles também.
Reynaldo Bessa:
Acho legal porque você criou aí essa aproximação, né? E essa
narrativa fragmentada tem muito a ver com a mente da dessa geração, dessa fase,
dessa pré-adolescência / adolescência, porque é a questão dos hiperlinks, né,
que vai abrindo sempre um espaço para um outro tema. Enfim, eu acho que isso
procede realmente, ao meu ver, que li o livro, né?
Keka Reis:
Que legal que você leu?
Reynaldo Bessa:
E gostei muito, eu te falei, né, gostei muito, porque ele é
diferente, ele é diferente, ele tem uma narrativa diferente, ele tem uma pegada
diferente, ele tem algo diferente ali que, como o Tino disse, o livro para
criança é o livro para adulto, é o primeiro leitor, enfim, e eu já... a próxima
pergunta, você meio que já respondeu, mas eu gostaria de saber se você puder
aprofundar, né? Que uma de suas leitoras, uma adolescente, conversando com ela,
me disse uma vez que é impressionante - nós falávamos sobre isso - como suas
personagens adolescentes são verossímeis, né? No jeito de ser, pensar, agir, os
conflitos, expressões idiomáticas, o mundo dos quais elas habitam. E essa
questão da fragmentação do pensar pelos hiperlinks e tudo mais. É, como você
cria os seus personagens. Eu sei que isso é dificílimo de falar assim, de forma
muito objetiva. É o resgate, diálogo que você faz com adolescente em você? Você
observa o adolescente, os adolescentes à sua volta, com os quais você convive,
enfim, seja família ou os amigos, amigos, dos filhos que seja. Ou você vive de
observar o mundo. O escritor é um observador. Então como é que você cria essa verossimilhança?
Onde você vai buscá-la, onde é que é a fonte? Fala pra mim.
Keka Reis:
Eu acho que é uma mistura de várias coisas. A primeira, sim,
é um resgate assim, né? Eu já fui pré-adolescente e já fui adolescente. E
agora, por exemplo, eu tenho 50 anos de idade. Eu entrei na menopausa, uma fase
que muitos psicanalistas e muita gente que estuda isso compara com a
adolescência, porque é uma mudança radical de fase de vida, de corpo, de
cabeça, de velocidade. Então acho que tem um resgate da adolescente que eu fui,
né? É, tem uma coisa de quando eu escrevi “O Dia”, por exemplo, que foi o meu
primeiro livro, né? Eu escrevi, eu já tinha mais de 40 anos, a minha filha
tinha essa idade, a minha filha estava com 10 ou 11 anos, eu acho. Então também
tinha um laboratório ali em casa. E depois que os dois livros dessa série foram
publicados, eu publiquei os outros romances. Eu comecei a circular muito pelas
escolas e conviver ainda mais. Quer dizer, eu já escrevia para esse público em
televisão e cinema, mas depois que os livros foram publicados, eu comecei a
conviver ainda mais com eles, com os adolescentes e com os pré-adolescentes. E
aí tem a ver com uma coisa que eu acho que a gente tem que fazer quando a gente é escritor, a gente trabalha
com as artes. Na verdade, todo mundo devia fazer isso, mas escritor mais do que
todo mundo, assim, que é ter um ouvido muito atento, ter um ouvido aguçado e
prestar atenção de verdade no que eles estão te dizendo ali, o que existe por trás
daquelas palavras. A boa literatura e o bom roteiro é o que está além do que
está dito ali.
Então, é você saber ouvir mais do que tudo. E acho que uma
das coisas mais importantes que a gente tem que fazer como escritores para
crianças e para adolescentes é nunca subjugar, né? É olhar assim como se estivesse
na mesma altura, num sentido de não ter essa nostalgia de achar que a minha
adolescência, que foi nos anos 80 / anos 90, foi melhor do que a adolescência
de hoje. Acho que é esse tipo de escuta, atenção e empatia, mais todo o
laboratório assim, né, conviver com eles ajuda muito e não perder a
curiosidade, né? Porque se você envelhece, eu tô gostando muito de envelhecer,
de verdade, acho envelhecer assim, pra mim, tá sendo muito, interessante, mas
eu acho que a gente não pode perder a curiosidade, entendeu? E isso aproxima a
gente do leitor, assim, você é uma pessoa curiosa, você está de olho... se você
escuta essa faixa etária. E tem uma outra coisa para além de tudo que eu já
falei, dos laboratórios e tal. Pré-adolescente e adolescente, o mundo pode
mudar, né? Vocês falaram bastante com o Pedro (Bandeira) sobre rede social e
tal. Tem muita coisa ali que mudou, mas tem muitas questões que são atemporais
e que são típicas dessa transição. Essas questões permanecem, então, talvez por
isso...
Reynaldo Bessa:
Por exemplo?
Keka Reis:
Por exemplo, a necessidade de se afastar dos pais e começar
a se sentir pertencente a um outro grupo que não aquele grupo familiar, que a
gente chama de pertencimento, né? Isso faz com que as relações, especialmente
entre pais e filhos, mas as mães acabam sofrendo mais sempre, porque elas estão
sempre muito mais coladas, fiquem mais tencionadas. Esse tipo de característica
do pré-adolescente, por exemplo, que é muito legal para qualquer escritor, é
que ele está sempre perambulando entra infância e adolescência num único dia,
né? O livro se passa num dia só. Ele pode ter atitudes supostamente muito
maduras e atitudes muito infantis. Querer correr de volta pro colo dos pais.
Essa transição, esse conflito que é típico dessa idade, é um fermento assim, para
esse bolo, é um elemento muito interessante para escrever para eles.
Reynaldo Bessa:
E uma coisa que eu achei interessante, que você disse isso
é, deve se observar bastante nesse ponto, nessas questões, né, atemporais? E
uma coisa que eu observei no seu livro é que, claro, todo o grande escritor,
num exercício de liberdade de arte que é a escrita, você não deve criar juízo
de valor, né? Você não deve julgar, você deve apresentar sem julgar. Cabe ao
leitor, cabe, enfim... E você não faz esse tipo de coisa no seu livro, você
apresenta vários conflitos, várias situações, mas você não fica dizendo que
fulano está certo, fulano está errado. Isso é um ponto também que eu ressaltei nos
meus apontamentos aqui sobre essa coisa que eu achei bem interessante, também.
Keka, rapidinho aqui, eu queria focar nessa questão dos
leitores no Brasil, que - também sou professor - me preocupo muito com isso. E
citava, falava com Tino (Freitas) sobre esses 4,6 milhões de leitores perdidos
e crescendo. E em contrapartida, nunca tantos livros foram editados e lançados.
É, então parece, às vezes, me parece que nós estamos fazendo, nós escritores,
estamos fazendo uma festa num apartamento, enquanto outro ao lado pega fogo.
Então fala um pouco sobre isso. Você, com a tua experiência, você tem algo que
você pode dizer, ‘gente, vamos fazer isso que dá certo’. Para evitar tantos... essa
tristeza de tantos alunos, tantos leitores, na verdade, em formação, perdendo
gosto pela leitura. Isso é fato, é um fato.
Keka Reis:
Tem a ver com uma coisa muito maior, não é, que eu não vou
nem ser capaz de discorrer em tão pouco tempo aqui, né? Que é a nossa educação
mesmo, que é a questão da educação, da não priorização da educação como uma
coisa fundamental na vida de todo e qualquer ser humano. Eu tenho assim, eu
acho que é tudo muito triste, é tudo muito grave. No entanto, assim, eu, nessas
minhas perambuladas pelas escolas, eu vejo uma coisa que eu acho muito bonito,
mas muito bonito, que é o esforço de determinados professores, professores de
literatura, professor de língua portuguesa, professor de teatro, que, cara,
eles fazem um trabalho tão bonito e é tão emocionante de ver. É claro que para
qualquer autor que está lá visitando uma escola, quando você percebe a falta de
incentivo financeiro mesmo, naquela escola, e vê um professor construindo
castelos assim, imaginários, para conseguir fazer um aluno ler, é claro que é
triste, mas ao mesmo tempo também é muito emocionante, mas é muito emocionante
de ver o trabalho que todos os professores Brasil afora estão fazendo - são os
verdadeiros guerreiros assim, entendeu? - para incentivar o hábito da leitura
nos seus alunos. Então é claro que tem esse dado tristíssimo, é claro que tem
esse problema, que é um problema basal nosso, né, da importância da educação.
E tem uma outra coisa assim, a gente não falou sobre isso,
mas existe também no meio da Literatura uma pouca atenção - todo autor que escreve
para o infantojuvenil sabe disso - uma pouca atenção à literatura infantil.
Como se a literatura infantil, infantojuvenil, fosse uma literatura menor. E
você sabe isso quando você percebe na programação das feiras que tem pouco
autor infantojuvenil falando, quase não tem programação com a gente, com esses
autores. Então, assim, isso que a gente está falando de formação, né, de
autores que estão formando, autores que escrevem infantojuvenil no meu caso. Você
está fazendo, pegando a mão do leitor que leu infantil e levando para
transformar essa pessoa em uma pessoa leitora na vida adulta. É muito
importante, é muito importante. Infantojuvenil não tem muito esse espaço, é
fato, qualquer autor infantojuvenil vai te dizer isso. Eu, como trabalho com
infantojuvenil em outras áreas, né? TV, cinema, teatro, mesma coisa. E não dá
para entender por que, né, porque é muito difícil escrever para criança e para
adolescente. Você tem que ter muita empatia, você tem que estar muito antenado
agora a respeito desse nosso problema. É um problema antigo que todo mundo sabe
que a gente discute, que é o problema da educação e de formar leitores, eu,
claro, sofro bastante de pensar, né? Às vezes vou em escolas particulares que
nossa, são crianças leitoras, são super incentivadas e não sei o quê. Você vai
na pública, né? Mas ao mesmo tempo eu me emociono com o trabalho de formiguinha
que muitos professores fazem. E que é assim, é maravilhoso de ver. Tem um
projeto, por exemplo, eu vi alguém falar aqui nos comentários da AEL. Tem um
projeto nas escolas públicas do Brasil inteiro, chamado de AEL, que é Academia Estudantil
de Letras. Eu sou patronesse de uma AEL aqui em São Paulo que é maravilhosa, os
trabalhos, trabalho que eles fazem lá, esses 3 professores... Ó, a Ana Regina
falou... Com as crianças, eles convidam essas crianças a ficarem no contraturno
do horário que eles estudam e aí eles ensinam, eles fazem peças de teatro, eles
apresentam livros e diferentes autores. É muito lindo. Então esses professores,
eu sei, tem alguns professores assistindo aqui, e eles estão de parabéns. Não é
justo, né, eles levarem essa missão nas costas. Tinha que ser uma missão, né, enfim,
de todos nós, do governo, dos pais, mas é, mas é emocionante de ver, e eu, otimista
que sou, eu procuro olhar para esse lado assim, abençoado das pessoas. É mais
ou menos quando eu penso que, sei lá, nunca quis ser médica na vida, ainda bem
que existe alguém que vai ser médica, aí tem uns professores maravilhosos, como
você, Bessa, cara, dão as mãos para os alunos e transformam esses alunos em
leitores, pois aqui devia estar sendo feito em casa também, mas não é, enfim.
Reynaldo Bessa:
Sim, e você falou uma coisa que é muito interessante, assim,
como professor, é triste, tem esse lado, mas também é mágico, né? Porque esse é
o grande desafio. Se fosse fácil, não teria a menor graça. Inclusive é depois
dos comentários aqui, né, do pessoal, que inclusive você citou a Regina aí, a
professora Algemira - que ministra o seu livro, né? Eu comentei isso, então, ela
vai falar sobre como é que ela faz isso, como é que ela utiliza, né, como que
ela, como, qual é a dinâmica dela em sala de aula com o teu livro. Claro,
diversos outros, mas a gente focou muito nesse teu livro, né, e na abordagem
que ela costuma fazer, tá bom?
Eu queria que você, se pudesse, se você quiser ler um
trechinho de alguma coisa que você tenha separado, se você quiser...
Keka Reis:
Eu separei, eu vou ler, tá bom, eu vou ler... Eu leio
rapidinho, eu separei um trechinho curto, é um capítulo do livro que chama “Quer
sentar do meu lado hoje na perua?”:
O sinal tocou, as pessoas saíram e voltaram, o professor de
Geografia entrou, o Bereba olhou pra mim de um jeito que ele nunca tinha olhado
antes na vida e deu o sorriso mais estranho do mundo. Parecia um meme, um meme
com música brega, efeito de câmera lenta. Não, isso não poderia estar
acontecendo. Eu não admito. ‘Quer sentar do meu lado hoje na perua?’ Eu olhei
de novo o bilhete e meu coração fez mais barulho do que o papel alumínio que eu
tentava amassar, disparado alto, rápido. Fica quieto coração, o professor de
Geografia não gosta de barulho. O embrulho do alumínio caiu no chão, respirei
fundo, tossi, respirei fundo de novo - pum, pum, pum, pum, pum. Decidi olhar
para o Bereba pra ver se ele me explicava que raios estava acontecendo e de
novo, aquele sorriso estranho de meme, música, câmera absurdamente lenta. Não, Bereba,
não, é você mesmo, meu amigo, que entende do aparelho reprodutor de todos os
aracnídeos? Bereba, o que tá acontecendo? Alguém pode me dizer? Bereba, seu
cabelo está bonito hoje. De repente, de uma hora para outra, você deu para parecer
o lobisomem daquela série que todas as meninas gostam e a gente adora detestar.
O lobisomem que tem um sorriso bonito. Bereba, para de sorrir desse jeito
estranho. Credo, detesto aquela série, aquele lobisomem, estou louca, Bereba
lobisomem. Soltei um grito na classe. Não! Todo mundo olhou para mim até o
Bereba. Agora de um jeito mais normal. Disfarcei. ‘Professor, posso ir ao
banheiro?’
Reynaldo Bessa:
(rindo) Que maravilha! A minha companheira estava aqui
rindo, ela gosta demais dos seus livros, enfim, é, Keka, querida, eu ficaria
horas aqui conversando com você, maravilhoso, mas a gente tem um tempo e eu não
vou correr nosso tempo, mas eu não vou correr porque não seria justo. Eu vou
manter a mesma marcha para com todos os outros. Tem a professora Algemira Kolar,
então muito obrigado pelas tuas palavras, tua participação e sucesso na tua
carreira, que já é sucesso, então vai ser aí ainda mais, tá certo? Tudo de bom
para você!
Keka Reis:
Eu que agradeço. Obrigada pelas perguntas. Foi uma honra
poder participar com tanta gente legal nesse programa. Obrigada.
Reynaldo Bessa:
Maravilha, pois é poesia, pra nós.
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